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terça-feira, abril 16, 2024
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Em entrevista exclusiva, Flavio Kawakami destaca importância do guia GAMP5

A validação de sistemas computadorizados é atividade cada vez mais exigida nas auditorias periódicas da Anvisa, pois atesta um alto grau de confiabilidade dos sistemas, com foco na segurança dos produtos que oferecem risco à saúde humana. A principal fonte para os profissionais que validam os sistemas é o guia GAMP (Good Automated Manufacturing Practice), que está atualmente na versão 5. É sobre esse assunto que o Portal Boas Práticas trata com o especialista Flavio Kawakami.

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Kawakami atua como sócio consultor na Doctor Bit

Formado em Tecnologia Mecânica – Processos de Produção pela FATEC São Paulo e em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas, Kawakami atuou nos últimos 25 anos como executivo em indústrias listadas pela Fortune Global 500 tais como Asea Brown Boveri, Magneti Marelli, Philip Morris, Kraft Foods e Laboratórios Wyeth, e desde 2005 atua como Sócio Consultor na Doctor Bit na área de Tecnologia da Informação, no Brasil e no Exterior.

Kawakami possui ampla experiência no uso da TI em indústrias, com experiência na automação de processos, implantação de ERP, administração de infraestrutura, treinamento de equipes e em qualidade de software.

Colaborador da Febrafarma/Sindusfarma, coordenou o Grupo de Trabalho que editou o manual “Diretrizes para a Validação de Sistemas Computadorizados aplicadas à Indústria Farmacêutica”, publicado em Outubro de 2006.

Atuou ainda como professor convidado da UFRJ, ministrou cursos e palestras pelo ISPE e pelo Sindusfarma SP, revisor do GAMP 5® e palestrante em diversos eventos como FCE-Pharma, SAP ASUG, CRF-SP, VISA-MG, Sinfar RS e Sindifar RJ. Membro do ISPE desde 2003, foi Diretor Consultivo eleito para os biênios 2005-2006 e 2007-2008, e fundador do Comitê ISPE GAMP Brasil.

Nesta entrevista, ele fala sobre o ciclo de vida do GAMP5®, dá sugestões preciosas sobre a atividade de validação e relata casos do dia a dia para ilustrar suas colocações.

Confira.

Tendo como base o GAMP 5® , o que precisa ser validado dentro da indústria farmacêutica e correlatas?

Antes de mais nada, enfatizo que o GAMP 5® é um guia e não uma norma ou regulamento, ou seja, apresenta um conjunto de melhores práticas baseado em diversas normas como ISO, ASTM e ANSI, além de outros guias, metodologias e documentos como ITIL, COBIT e ICH. Sendo um guia, a indústria tem a liberdade de definir dentro de suas políticas e procedimentos internos como tomar suas decisões sobre o tema, ou seja, o guia não determina o que precisa ser validado, mas apresenta as melhores práticas para que seja realizada a avaliação dos riscos que os sistemas computadorizados em uso na cadeia de produção oferecem na qualidade do produto e/ou na integridade das informações. Uma vez que tenham sido identificados estes riscos, uma decisão sobre quais são os sistemas que devem ser validados é tomada. Para apoiar este processo decisório, o guia estabelece um conjunto de 4 categorias de software e para cada uma das categorias uma estratégia de validação é proposta, podendo variar entre um simples inventário para um software de infraestrutura até a documentação de código fonte de programas para um software customizado.

Como fazer a validação de sistemas computadorizados de forma sistemática e criteriosa?

Como o próprio enunciado da questão expõe, para ser sistemática e criteriosa o primeiro passo é a criação de um conjunto de políticas e procedimentos que defina de forma clara o que validar e como validar. O guia propõe que as atividades sejam classificadas entre: gerenciais, onde todo o planejamento estratégico do sistema a ser adquirido deve ser definido incluindo o processo de qualificação dos fornecedores potenciais do sistema e os papeis e responsabilidades da equipe de projeto; de desenvolvimento, onde o sistema computadorizado deve ser documentado de acordo com os processos com os quais ele interagirá incluindo toda a infraestrutura tecnológica sobre o qual será instalado; e de operação, onde as atividades de suporte técnico e manutenção do estado de validado devem ser definidas através de procedimentos específicos para cada sistema.

Quais as vantagens a atividade traz para a indústria farmacêutica?

Uma maior aderência do sistema computadorizado aos processos regulados, a diminuição dos riscos que o sistema apresenta para a qualidade do produto e/ou integridade das informações, e dependendo da atuação da equipe de projeto um significativo ganho de produtividade através da substituição de controles manuais por controles tecnológicos assegurados através de uma estratégia de testes adequada.

Quais os principais requisitos do 21 CFR Part 11 e como alcançar a conformidade dos sistemas futuros e dos já instalados?

Apesar de orientar meus clientes no sentido de evitar a utilização de um regulamento dos Estados Unidos da América, que não possui qualquer tipo de jurisdição sobre os medicamentos manufaturados no Brasil a menos que estes sejam exportados para lá, e mesmo assim, para os casos de exportação existe um acordo que prevê que uma auditoria realizada pela ANVISA possa ser aceita pelo FDA (entendendo bem que pode, mas não necessariamente o é), acredito que alguns pontos específicos podem ser utilizados pela indústria, a seu inteiro critério, para aumentar a segurança das informações, pois é disto que trata este capítulo do 21 CFR. Infelizmente, no Brasil, considero estarmos muito distantes de uma conformidade com este regulamento devido à falta de entendimento e desenvolvimento tecnológico de nossos fornecedores de soluções, além de entender que nossa cultura organizacional e orçamento disponível para investimento em tecnologia não favorece a conformidade. O texto deste regulamento é dúbio, gera muitas interpretações e encarece sobremaneira um projeto de implementação de um sistema, tornando muitas vezes viável apenas para as empresas cuja matriz, geralmente americana, impõe através de políticas internas a conformidade e custeia o projeto. Voltando à questão, o investimento maior é em segurança da informação e em treinamento dos usuários e técnicos de suporte, além da qualificação de toda a infraestrutura tecnológica envolvida com o sistema computadorizado. Para sistemas instalados são raras as oportunidades onde o investimento necessário compensa a adequação, sendo recomendável a substituição do sistema computadorizado por outro que esteja mais aderente aos requisitos.

Quais os requisitos para montar e conduzir uma validação?

Reforçando o exposto na questão 2, sem um conjunto de políticas e procedimentos que tenha como alcance as três fases propostas pelo GAMP, ou seja, gerencial, de desenvolvimento e de operação e manutenção, é impossível conduzir uma validação bem sucedida, sendo quase certo que para cada sistema serão adotados critérios diferentes dependendo do líder do projeto ou do prestador de serviço contratado, não atingindo portanto o objetivo da validação. Uma equipe de projeto plenamente capacitada para manter o foco nestes objetivos, que em última análise, não se resume à criação do conjunto de documentos prescrito nos guias disponíveis mas deve se estender a uma profunda análise de riscos que deve sempre considerar a reengenharia dos processos onde o sistema computadorizado será utilizado. Para tanto uma equipe multidisciplinar que contenha no mínimo representantes das áreas regulatória, garantia da qualidade, engenharia, tecnologia da informação e da área usuária deve ser montada e um gerente de projeto designado. Outro equívoco geralmente cometido pela indústria é comprar o sistema antes de verificar os riscos do processo e avaliar a aderência do sistema computadorizado aos requisitos da área de negócio onde este será utilizado. Com relação ao prescrito no GAMP, há que se avaliar para cada tipo de sistema qual a sua categoria para definir o conjunto de atividades e documentos que deverão compor a validação.

Ciclo de vida do GAMP 5® : quais as responsabilidades do cliente? E do fornecedor?

O fornecedor, como detentor do conhecimento técnico do sistema computadorizado, tem como responsabilidade a redação dos documentos técnicos aplicáveis para a categoria do sistema e a execução dos testes de aceitação, também quando aplicáveis. Não considero uma boa prática, apesar de notar que a indústria a utiliza com frequência, delegar as atividades de qualificação do sistema computadorizado ao fornecedor, aliás, esta é uma prática condenada pelas metodologias de desenvolvimento de sistemas onde quem desenvolve nunca testa, os testes devem sempre ser independentes para que os desafios ultrapassem o limite de conhecimento do desenvolvedor. Após a implementação do sistema computadorizado, o fornecedor deve garantir o suporte técnico de terceiro nível e a documentação completa de todas as atualizações de software que disponibilizar aos seus clientes. Todas as demais responsabilidades são do cliente.

Cite alguns cases  realizados recentemente. Descreva as necessidades do clientes e a solução adotada.

Em 2012 tivemos uma carga muito grande de trabalho devido ao prazo final estabelecido na RDC 17 de 2010 estar próximo e foram inúmeros os projetos onde participamos, no entanto, ressalto os projetos de sistemas novos onde participamos e pudemos orientar nossos clientes desde a etapa de concepção da necessidade até sua implementação final, como ocorreu na implementação de um sistema LIMS num laboratório de capital europeu. A parceria estabelecida com o fornecedor foi de vital importância, pois pudemos auxiliá-los no entendimento dos requisitos regulatórios do segmento farmacêutico, já que sua experiência era maior no segmento petroquímico, aumentando a segurança dos registros eletrônicos gerados e eliminando completamente o uso de laudos impressos, já que foi construída uma interface com o ERP onde os resultados das análises são transcritos para o módulo de qualidade deste ERP, onde o supervisor do CQ realiza a conferência dos resultados e aprova ou reprova o lote diretamente no sistema. Esta estratégia propiciou a eliminação do risco de erro humano na transcrição dos resultados além de diminuir o tempo de avaliação dos resultados pelo supervisor do CQ, permitindo inclusive que este realizasse esta atividade de forma remota. Outro benefício decorrente dos estudos pré-projeto foi a implementação do controle de estoque de todos os reagentes químicos através do sistema, com a criação de ordens de produção de dissoluções que garantem a rastreabilidade total de cada análise realizada de forma eletrônica e segura. Há que se ressaltar que os investimentos neste projeto foram de grande monta, muitos instrumentos tiveram que ser substituídos devido à falta de compatibilidade de suas interfaces de saída de resultados e uma infraestrutura de TI teve que ser montada para atender exclusivamente o laboratório físico-químico, mas este foi o maior ganho da validação, pois foram definidos 100% dos requisitos antes do início de sua implementação e não tivemos durante a fase de qualificação nenhum desvio significativo que impedisse sua liberação para uso em ambiente de produção.

3 thoughts on “Em entrevista exclusiva, Flavio Kawakami destaca importância do guia GAMP5

  • Luis Gustavo Berenguel

    Como costumo enfatizar, toda atividade de validação, muito mais do que uma exigência regulatória, é uma importante ferramenta para conhecimento e, principalmente, melhoria dos processos. Grande matéria, parabéns ao Flávio e ao Portal!

  • Suellen P. M. Adia

    Concordo plenamente com o gentil comentário de nosso colega Luis Gustavo Berenguel! A fase de validação sempre pode ir além do horizonte regulatório atingindo o ambiente processual, tecnológico e sistêmico com ousadia e “feeling” para a famosa “melhoria contínua”…
    Excelente matéria pessoal, já estou ansiosa pela próxima. Abraços

  • Concordo plenamente com a primeira colocação deste artigo: A validação de sistemas computadorizados é atividade cada vez mais exigida nas auditorias periódicas da Anvisa.
    Antigamente somente escutávamos que as primeiras solicitações numa inspeção eram referidas a Sistemas de água e HVAC.
    Hoje a validação dos sistemas computadorizados, quando bem feita, demostra um comprometimento com a qualidade e uma consistência normativa.
    As explicações do Flávio são mais do que elocuentes e perfeitas.

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